“O modo que um povo tem para compreender o mundo em que vive. Conhecendo o folclore de um país, pode-se compreender o seu povo. E assim conhecemos, ao mesmo tempo, parte de sua História. Tudo que é folclore é popular. Mas, nem tudo que é popular é folclore”, declara o professor Severino Vicente, Presidente da Comissão Norte-Riograndense de Folclore e conselheiro Nacional da Comissão do Folclore para o Nordeste que concedeu uma entrevista para O JORNAL DE HOJE.
Os historiadores Severino Vicente e Gutemberg Costa assumiram no mês passado a presidência e vice-presidência da Comissão Norte-Riograndense de Folclore. Instituição que foi criada por Câmara Cascudo há 60 anos e que tem a responsabilidade de estudar, preservar, divulgar, promover e valorizar a cultura popular do Estado. O JORNAL DE HOJE conversou com eles sobre o folclore potiguar. Confira!O Jornal de Hoje - Por que o Rio Grande do Norte é importante para o contexto cultural do Brasil?
Severino Vicente – O Rio Grande do Norte é um dos estados brasileiros mais privilegiados quanto à diversidade e conteúdo de cultura popular. Em primeiro lugar, é a terra de Câmara Cascudo, considerada por muitos dos seus contemporâneos um dos maiores folcloristas do Brasil. Outro ponto é que o nosso Estado é o único do Brasil que ainda mantém vivo quatro grandes autos populares, que são: Boi de Reis, Fandango, Chegança e Congo. Sem falar nas danças tradicionais. Em terceiro lugar, no final dos anos 20, o Rio Grande do Norte recebeu o escritor Mário de Andrade que junto com Cascudo realizou a primeira classificação sobre os nossos autos e danças folclóricas. Sem contar os nossos mestres e gênios da cultura popular.
O Jornal de Hoje – O senhor poderia citar alguns nomes?
Severino Vicente - Muitos... O Rio Grande do Norte é conhecido por ser o berço do maior embolador do Brasil que foi Chico Antônio, esse mestre foi personagem de inúmeros livros, musicas, artigos de jornais e revistas, entre outros. Temos Chico Daniel que foi um dos maiores mamulengueiros do país. A maior romanceira Dona Militana, que dos 54 romances da península ibérica que estam documentados, ela conta 34. Outro nome importante é o de Mestre Cornélio que salvou o mais importante patrimônio estético da cultura nordestina medieval – o araruna. Por tudo isso, é que a cultura popular do nosso Estado tem que ser valorizado.
O Jornal de Hoje – O senhor acha que a cultura popular potiguar não é valorizada?
Severino Vicente - Valorizada? Pelo contrario. Não existe um projeto direcionado para o patrimônio popular do Rio Grande do Norte. Os gestores públicos são sugestionados quando a mídia divulga alguma coisa.Eles correm para cima. Só querem tirar partido do artista.
O Jornal de Hoje – Como assim, tirar partido do artista?
Severino Vicente - Esquecem que o artista é uma pessoa. E, que precisa comer, morar... E, principalmente, precisam ter mais espaço e oportunidades para apresentar a sua arte. Eles (os artistas) estam perdendo a estima porque não são convidados para se apresentarem em lugar nenhum.
O Jornal de Hoje – Os senhores podem citar algum exemplo?
Severino Vicente - Claro! Por exemplo, o Araruna que esteve a pouco tempo na mídia, depois da morte de seu Cornélio não fez mais nenhuma apresentação. Essa informação partiu da diretoria numa reunião com a Comissão. Outro caso, é do filho de Chico Daniel, com o pai ele aprendeu a arte dos mamulengos, que terminou por encostar a mala de bonecos num canto qualquer e foi trabalhar como ajudante de pedreiro em Itajá. Não podemos esquecer de falar do mestre dos Congos, José dos Santos Correia que se encontra sem nenhum amparo muito doente no hospital Walfredo Gurgel. E, a comissão não tem recursos financeiros para ajudá-lo.
O Jornal de Hoje – Então, deveria ter um apoio maior dos gestores públicos ao que se refere a valorização da cultura e dos artistas que fazem a cultura popular do Rio Grande do Norte?
Gutemberg Costa – Com certeza! A comissão Norte-Riograndense de Folclore está aberta para dialogar com ele. É importante que as manifestações do folclore sejam equiparadas às demais formas de expressão cultural, bem como seus estudos aos demais ramo das humanidades conseqüentemente deve ter o mesmo acesso, de pleno direito, aos incentivos públicos e privados concedidos à cultura em geral e às atividades científicas através da pesquisa, ensino-educação, turismo, atividades parafolclóricas, comunicação de massa, publicações, intercâmbio, hierarquias.
O Jornal de Hoje - E, tem algum projeto de incentivo cultural em desenvolvimento na esfera política que os senhores apostam?
Gutemberg Costa – A comissão está ansiosa para ver posto em prática o RPV, a Lei de Registro do Patrimônio Vivo que é um espécie de bolsa salário que não resolverá em curto prazo. Mas, acreditamos que em médio já começará afazer efeito. O problema é que tem de ser aplicada o mais rápido possível, pelo simples fato que se demorar muito, os beneficiados, no caso, os mestres da cultura potiguar que já estam em idade avançada não estarão vivos para serem beneficiados. Mas, é importante lembrar que incentivar não é só dar roupa ou salário. Tem que dar oportunidade de gerar apresentações e não deixar cair no ostracismo cultural que se encontra o folclore potiguar na atualidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário